“Naquela época, o exército do rei da Babilônia sitiava Jerusalém e o profeta Jeremias estava preso no pátio da guarda, no palácio real de Judá.” (Jeremias 32.2)

É exatamente como um carro desgovernado! Um carro descendo a serra, numa noite sombria, diante de uma tempestade intensa, sem controle, fazendo manobras perigosas. Tudo o que o motorista tem diante de si é uma visão míope do que está à sua frente. Tudo o que ele vê é um parabrisa embaçado, sem saber o que está acontecendo, nem mesmo para onde está indo. É assim que podemos ler os dias que estamos vivendo como nação, em meio à atual crise política e econômica do Brasil. Estamos míopes, não sabemos o que a manchete do jornal nos trará amanha, não conseguimos compreender onde tudo isso vai chegar… É como um carro desgovernado! É um governo que usa manobras para proteger, fugir e escapar de tudo aquilo que ele tem criado, é uma oposição que vem com suas manobras, impulsionadas pela mídia, para tentar desbancar o governo atual. É manobra para todos os lados. Não há freio, não se sabe onde isso tudo vai dar: se sai PT entra PMDB, se sai PMDB entra PSDB, e, sinceramente, não tem muita diferença para o PCC! Parece crime organizado e nós estamos desenfreados, míopes em relação ao que vem diante de nós. Se vou às ruas, eu sou marionete de uma mídia e uma oposição que quer fazer barulho, se eu fico em casa, sou conivente com a situação atual… Difícil decidir. Miopia social é o que nós vivemos nos dias de hoje.

De semelhante forma, porém num contexto bem distinto, vivia o povo de Deus em Jeremias, capítulo 32: a pátria amada, idolatrada, salve, salve, Jerusalém! A pátria de um sonho intenso era Jerusalém, um sonho de amor e de esperança, um sonho de uma nação chamada por Deus diante de todas as nações para ser Sua voz, o anúncio da revelação de Deus à todos os povos! Jerusalém era a capital da nação de Israel, possuía uma história de operação de milagres de Deus no governo da sua história. Mas naquele momento, Jerusalém estava sitiada, dominada pelo império babilônico do rei Nabucodonosor, um rei ímpio e mau que oprimia o povo. Zedequias, o rei de Jerusalém, era homem omisso, era convidado à desfrutar da esperança em Deus mas vivia como se Ele não existisse. Israel era uma nação míope, uma nação sitiada por inimigos, por corrupção, por injustiça social, por impunidade! Seus líderes eram omissos e a verdade estava aprisionada. Jeremias é um profeta que se levanta nesse contexto para anunciar a verdade de Deus, mas estava preso porque ele disse para a nação que ela tinha pecado contra Deus, e mesmo tendo em toda a sua história o testemunho de que Deus lhes ofereceu amor, eles responderam com rebeldia. A palavra do profeta era de juízo! Ele os adverte sobre o domínio, devastação e cativeiro que se seguiriam pelo ataque da Babilônia.  Diante disso, o rei Zedequias, ao invés de acatar à voz de Jeremias e voltar-se para Deus, manda prender o enviado do Senhor, pois considerou as palavras dele duras e sem credibilidade. A voz divina, por meio de Jeremias, a verdade, a oportunidade de mudança estava presa. Então, Deus se levanta, resolve acabar com aquele cenário político míope cheio de guerra e faz um protesto!

“Portanto, assim diz o Senhor: ‘Estou entregando esta cidade nas mãos dos babilônios e de Nabucodonosor, rei da Babilônia, que a conquistará. Os babilônios, que estão atacando esta cidade, entrarão e a incendiarão. Eles a queimarão juntamente com as casas nas quais o povo provocou a minha ira queimando incenso a Baal nos seus terraços, e derramando ofertas de bebida em honra de outros deuses. “Desde a sua juventude o povo de Israel e de Judá nada tem feito senão aquilo que eu considero mau; de fato, o povo de Israel nada tem feito além de provocar-me à ira”, declara o Senhor. Desde o dia em que foi construída até hoje, esta cidade tem despertado o meu furor de tal forma que tenho que tirá-la da minha frente. O povo de Israel e de Judá tem provocado a minha ira por causa de todo o mal que tem feito, tanto eles como os seus reis e os seus líderes, os seus sacerdotes e os seus profetas, os homens de Judá e os habitantes de Jerusalém. Voltaram as costas para mim e não o rosto; embora eu os tenha ensinado vez após vez, não quiseram ouvir-me nem aceitaram a correção. Profanaram o templo que leva o meu nome, colocando nele as imagens de seus ídolos. Construíram o alto para Baal no vale de Ben-Hinom, para sacrificarem a Moloque os seus filhos e as suas filhas, coisa que nunca ordenei, prática repugnante que jamais imaginei; e, assim, levaram Judá a pecar”. (Jeremias 32.28-35)

Deus protesta, Ele vem à publico e anuncia um juízo! Ele protesta contra um homem que nunca foi ensinado a mentir, mas que sabia mentir, contra um homem que nunca foi ensinado à desobedecer, mas sua natureza o levava à isso, um homem que teve a oportunidade de conhecer a Deus, cujo rosto foi levantado para Deus, uma vez que ele descobriu que nele havia certo senso de justiça e senso do que é certo. Quando ele foi convidado a olhar para isso e entender que Deus existia, ele negligenciou tal conhecimento e continuou vivendo segundo seus próprios caminhos e entendimento deturpado de justiça, conforme o que lhe agradava e o que lhe era por certo. Este homem  começou a vivenciar um ambiente de guerra em todas as relações que estabelecia (família, trabalho), buscava o seu bem estar a despeito de quem precisasse passar por cima para chegar à este fim. Esse homem representa a mim e a você! Somos pessoas que desde o nascimento temos desprezado o conhecimento de Deus! Uma vez que fomos chamados à resplandecer Sua imagem e semelhança, fazendo o bem, nós fazemos só o que é mal… Afundados em justificativas e reivindicações, nós vivemos em guerra e corrupção. Tiago diz que as guerras dos homens surgem da cobiça de seu próprio coração (). Esse homem não virou o rosto para Deus, ele virou as costas, virou tudo, e é contra isso que Deus protesta em Jeremias capítulo 32. Um homem tão cheio de si que faz deuses, cria objetos de adoração: dinheiro, poder, fama, sexo, religião, comida… Mas a verdade é que ele não serve à esses deuses, porque eles só servem para satisfazer à ele mesmo, que é o seu próprio deus. E, pelas palavras do profeta Jeremias, é contra isso que deus protesta! Nosso Deus é um Deus de protestos, que protesta piamente contra o pecado da nação que não o adora e foge de seus princípios e valores.

Nós somos o povo identificado como povo de Deus, somos o povo que protesta contra corrupção, precisamos ser o povo que protesta contra a condição suja e depravada do homem. Nós nos levantamos e protestamos sim, porque onde há pecado, há ira de Deus e nós precisamos nos levantar contra isso! Se você sai às ruas para protestar contra a corrupção, contra a impunidade, contra a injustiça social, você não faz mais do que a sua obrigação. Mas a questão é: por que você sai às ruas? Meu medo é que nós saiamos às ruas como tantos entrevistados pela mídia, que assumem opiniões alheias de facebook e das massas, incorporando uma multidão alienada e, no fundo, não fazem a menor ideia do porquê estão ali. Vão às ruas sem saber por que vão às ruas! É como uma disputa por times de futebol… Não! Nós protestamos contra quem quer que seja e protestaremos quantas vezes forem necessárias, porque nós protestamos contra a corrupção. Independentemente de quem esteja lá em cima, se for corrupto, nós estaremos na rua. Porque nós somos nação de Deus e protestamos contra a corrupção sim! A questão é: como você lê tudo isso? Isso precisa do mínimo de reflexão sua, consistente e coerente. Deus é Deus de protesto! A nossa história é a da Reforma Protestante, nós nascemos de um protesto contra o pecado, mas Deus é também um Deus que nos chama a protestar numa caminhada de fé. Ainda preso, Deus aparece a Jeremias e diz o seguinte:

“E Jeremias disse: “O Senhor dirigiu-me a palavra nos seguintes termos: Hanameel, filho de seu tio Salum, virá ao seu encontro e dirá: ‘Compre a propriedade que tenho em Anatote, porque, sendo o parente mais próximo, você tem o direito e o dever de comprá-la’. […] Porque assim diz o Senhor dos Exércitos, Deus de Israel: Casas, campos e vinhas tornarão a ser comprados nesta terra.” (Jeremias 32.6-7;15)

Vocês conseguem entender o que está acontecendo? Em meio à todo aquele caos, Deus chama Jeremias, no meio de uma cidade dominada pelo império babilônico, uma cidade que tem o seu futuro dizimado decretado por Deus, e ordena-lhe que compre uma terra que é por direito seu. Como assim? Comprar uma terra num território que será totalmente tomada pelo império babilônico? Imaginem Jeremias, em meio à uma guerra, fazendo negócios para comprar um terreno. Sabe por que ele fez isso? Porque ele entendeu que Deus lhe estava convocando para uma caminhada de fé! Na sequência do texto, o profeta cai de joelhos e ora a Deus dizendo: “Senhor obrigado, obrigado porque Tua palavra final é de graça e misericórdia, obrigado pois o Senhor está mandando eu comprar essa terra porque depois que seu juízo for cumprido, darás oportunidade para o seu povo voltar pra essa terra, onde os campos serão retomados. O que Deus pede para Jeremias é um ato de fé. Ele diz: “ainda que você não veja, ainda que Nabucodonosor te intimide, ainda que toda essa corrupção esteja ao teu lado, ainda que tudo isso te pareça como um carro desgovernado, Eu tenho o controle da história em minhas mãos! Diante disso, Eu peço que você haja com fé nas minhas promessas, Eu tenho promessas para o meu povo, Eu levanto o meu povo!” Esse é o chamado de Deus para nós: agir por fé. Fé é lutar, protestar e reivindicar as promessas e a vontade de Deus!

Mas espere um pouco… Aí eu vou para a rua e identifico cristãos protestando, crentes chamados à uma vida de fé, mas que devem dinheiro, que tem nome sujo, que são mentirosos, que não perdoam, que não dão bom testemunho… Na verdade o que eles tinham que fazer é ir para rua e dizer: eu protesto contra mim! Porque eu não sou diferente de ninguém que está lá em cima no poder, porque eu sou corrupto também! Negligencio leis de trânsito, sou indiferente ao padrão de Deus para sexualidade e pureza,  eu não “tô nem aí” para esse negócio de “religião de caixinha”, eu não “tô nem aí”  para Deus!  Quantos estão nessa posição e vão para a rua protestar, e postam fotos no facebook, e se insurgem contra a corrupção do outro, mas não de si próprios! Deus lhe manda fazer o que é certo para glória de Seu nome, assim como mandou Jeremias comprar um terreno em Anatote. Enquanto todo mundo diz para fazer o que é errado, Ele manda fazer o que é certo, enquanto todo mundo diz que o prazer é o que impera, Ele diz para você se apoiar em Sua glória. Essa é a caminhada de fé diante de um povo e de um tempo que nós não entendemos. Infelizmente, o que está lá no governo é o reflexo do que são as massa aqui embaixo… Quantas vezes nos corrompemos por tão menos do que eles… Deus nos chama à uma caminhada de fé, Ele queria chamar o povo de Israel para uma caminhada de fé, e Jeremias está ali para anunciar o protesto de Deus em juízo contra o pecado, mas também para anunciar que há oportunidade de uma caminhada de fé. Caminhada que se revela na nitidez do que há por vir, que rompe com o embaraço da miopia e traz clareza, traz visão límpida, traz certeza do futuro, traz segurança do que esta à nossa frente.

“Portanto, assim diz o Senhor a esta cidade, sobre a qual vocês estão dizendo que será entregue nas mãos dos babilônios por meio da guerra, da fome e da peste: “Certamente eu os reunirei de todas as terras para onde os dispersei na minha ardente ira e no meu grande furor; eu os trarei de volta a este lugar e permitirei que vivam em segurança. Eles serão o meu povo, e eu serei o seu Deus. Darei a eles um só pensamento e uma só conduta, para que me temam durante toda a sua vida, para o seu próprio bem e o de seus filhos e descendentes. Farei com eles uma aliança permanente: Jamais deixarei de fazer o bem a eles, e farei com que me temam de coração, para que jamais se desviem de mim.” (Jeremias 32.36-40)

O que Deus afirma aqui, aplica-se primariamente a Israel: “minha justiça esta cumprindo seu papel aqui, eu ofereço uma caminhada de fé, mas eu sou gracioso, vocês voltarão, eu os abençoarei e farei uma aliança eterna com vocês.” Que aliança é essa? Uma aliança de que Israel, pela graça de Deus, voltaria para Jerusalém. Mas também vislumbra uma aliança eterna que traz em Jesus Cristo a certeza da salvação, a certeza de que toda corrupção humana é odiada por Deus, mas há em Jesus a oportunidade de uma vida diferente. Uma aliança eterna que para nós, hoje, significa refletir sobre a situação política e econômica do país, temer diante de tamanha sujeira, mas olhar para toda a degradação e corrupção primeiramente do meu coração de modo que nos prostremos diante de Deus dizendo: “Senhor eu sou corrupto, sujo, vivo para mim tantas vezes mesmo conhecendo Tua Palavra. Eu preciso da Tua presença, da Tua glória em minha vida.” Isso é caminhada de fé, e para esses Deus diz (e isso se estende à nos até à eternidade): “Eu serei o Seu Deus, você será o meu povo, Eu farei uma aliança contigo e permitirei que você viva diante de um carro desgovernado na certeza que eu conduzo a história. Eu farei com que você tema o Meu nome.  Diante de tudo isso, você saberá que é possível protestar, independente de quem estiver lá em cima, contra você mesmo e essa corrupção moral que permeia tua vida. Eu quero fazer de você a minha nação, quero te levar para ter um relacionamento comigo eternamente, em Cristo Jesus. Eu quero trazer você para as ruas para protestar na sua família, dentro da igreja, para que você seja Minha voz, encontrando  nos seus sofrimentos e privilégios  a grandeza de depender de mim. Essa é a aliança eterna que faço com meu povo, Eu serei o seu Deus e vocês serão o meu povo.”

É tempo de tomarmos posição, é tempo de vivermos por fé, é tempo de nitidez de vida, é  tempo de romper com a miopia e olhar para esperança que Deus nos dá em Cristo Jesus.

Pregação do Pr Renato Buzo em 19.03.2016 (Igreja Batista de Tupã)

Título original: “Uma resposta à miopia social”

Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=Kl7xCaBsqR0

Transcrição, adaptação e edição: Thais Baldassarre

Publicação feita com a autorização do pregador