Sílvia era cristã e estava no terceiro ano do Ensino Médio. Enquanto todo mundo já sabia o que iria fazer na faculdade, Silvia ainda se sentia perdida e confusa. “Não aguento mais essa indecisão!”, ela pensava todos os dias, “Será que Deus não vai me orientar, me ajudar de alguma forma? Como eu vou saber qual a Sua vontade para a minha vida?”, “Todos já sabem o que querem, porque só eu ainda não sei?” Embora pensasse nessas coisas, não procurou ajuda e nem pesquisou sobre nenhuma profissão, “afinal”, pensava ela, “já estou muito cansada por ter que estudar tanto. Todo dia são mais de 60 exercícios, fora o conteúdo dos livros… se eu perder tempo pesquisando sobre essas coisas vou ficar atrasada e nunca vou passar no vestibular!” Finalmente, seus pais decidiram inscrevê-la em um curso de orientação vocacional. “Não acredito que além de assistir aulas o dia todo, ainda vou ter que ir nesse curso à noite! Estou tão cansada!”, pensou Sílvia, ao receber a notícia. Ao final do curso, quando o resultado apontou para Licenciatura em Matemática, ela comentou com sua amiga “Nossa, licenciatura? Não tem como se sustentar com o salário de professora! Não acredito que deu justo esse resultado!”. O tempo foi passando e ela decidiu prestar engenharia, porque era algo próximo de matemática e seria mais lucrativo. Quando o resultado do vestibular finalmente saiu, Silvia viu que tinha sido aprovada, mas pensou “Bem que eu podia ter passado na USP, seria tão mais fácil, eu não teria que mudar para outra cidade. Agora que passei na UNESP, vou ter que ir para outra cidade e já me dá preguiça só de pensar em fazer a mudança! Era melhor eu nem ter passado, porque aí eu ia ficar aqui e fazer cursinho mais um ano, quem sabe eu não passaria na USP? Agora meus pais vão querer que eu vá e eu vou ter que fazer o que eles falam, porque tenho que ‘honrar pai e mãe’. Que droga!”

Andrea também era cristã e sonhava desde a adolescência em encontrar o “homem da sua vida”. Ela já estava com 25 anos e nada. Nunca tinha namorado, nem beijado ninguém, porque tinha ‘escolhido esperar’. “Ai, Deus, até quando vou ficar encalhada desse jeito?”, ela pensava. Pensamentos como “Será que ninguém nunca vai olhar para mim?”, “Porque todas as minhas amigas estão namorando e casando e eu, nada?” e “Esse negócio de esperar não vai dar em nada. Aposto que se eu tivesse feito como a Ana, que ficou com vários meninos na adolescência, eu teria tido mais experiência e saberia como conquistar um cara. Agora eu fiquei nessa de ‘esperar’ e aí? Tô solteira e não tenho perspectiva nenhuma!” sempre passavam por sua cabeça. Quando finalmente um rapaz crente se aproximou e começou a demonstrar interesse, ela correspondeu e eles começaram um relacionamento de namoro. Mas depois de seis meses, ela já não estava mais tão feliz assim. “Ele quase não me dá atenção!” ela pensava. “Parece que me liga só pra cumprir um check list, não quer saber de nada do que eu fiz durante o dia”. “Ele nunca fala de casamento, acho que não gosta de mim o suficiente”, “Será que eu deveria continuar um relacionamento que não vale a pena? Queria um homem que me amasse, mas meu namorado parece muito indiferente. Que droga! O que devo fazer? Acho que preferiria ter ficado solteira desde o início, porque agora não seria tão difícil terminar, eu não teria me envolvido e estaria bem melhor, sem sofrer.”

Queria tanto namorar, e agora que namora queria estar solteira… queria tanto passar no vestibular, e agora que passou preferia ter sido reprovada. O que Andrea e Sílvia têm em comum? Ambas têm sido escravizadas pelo pecado da murmuração.

A murmuração de Israel

Para entender um pouco melhor o que é a murmuração, vamos olhar para o caso do povo de Israel, no capítulo 14 do livro de Números. O contexto é até que bem conhecido por nós: depois de 400 anos de escravidão, sofrimento e exploração do povo de Israel no Egito, Deus responde as orações do povo e levanta Moisés, e Arão, seu irmão, para libertá-los. Orientados por Deus, eles confrontam o Faraó e todos os deuses egípcios, demonstrando claramente que somente o Deus de Israel era o deus verdadeiro e fazendo os egípcios temerem a esse Deus. Finalmente, eles são libertos e Deus literalmente divide o mar Vermelho em duas partes, fazendo o povo atravessar em segurança e em terra seca, enquanto os soldados egípcios que os perseguiam são engolidos pelo mar logo na sequência (Ex 14). O povo recebe a lei, é instruído por Deus qual caminho seguir (Ex 20) e finalmente se aproxima da terra prometida. Antes de entrarem, Deus os orienta a mandarem 12 espias para checarem a terra, conhecendo seus frutos abundantes e maravilhosos, e também tomando conhecimento dos desafios que teriam pela frente (Nm 13). Quando esses espias voltam de sua missão, apenas dois deles (Calebe e Josué) encorajam o povo a obedecer a Deus “Subamos e tomemos posse da terra. É certo que venceremos!” (Nm 13.30), enquanto os outros dez “espalharam entre os israelitas um relatório negativo acerca daquela terra.” (Nm 13.32), afirmando que certamente não conseguiriam conquista-la. É então que se inicia o capítulo 14 de Números:

Quem dera tivéssemos morrido no Egito! Ou neste deserto! Por que o Senhor está nos trazendo para esta terra? Só para nos deixar cair à espada? Nossas mulheres e nossos filhos serão tomados como despojo de guerra. Não seria melhor voltar para o Egito? ” (Nm 14.2,3)

Percebe o padrão? O povo estava sofrendo e insatisfeito no Egito, e Deus enfim liberta-os para uma nova vida, mostrando o Seu incrível poder por meio de milagres fantásticos. Deus se revela, dá leis para orientar e proteger Seu povo e promete ser seu cuidado e sustento. Mas ao invés de confiar em Deus, o povo olha para as situações como se Ele não fosse soberano o bastante para prevê-las, ou como se não fosse poderoso o bastante para ajudá-los. E então murmuram, resmungam, choramingam como crianças mimadas que não ganharam o presente que queriam no Natal. “Seria melhor ter morrido no Egito”, dizem os mesmos que no capítulo 3 de Êxodo estavam clamando a Deus para serem libertos da escravidão egípcia. “Queria tanto estar solteira de novo”, diz aquela que reclamou a vida inteira por não ter um namorado. “Queria nunca ter sido aprovada no vestibular”, diz aquela que orou tanto para passar.

E qual a reação de Deus diante desse mi-mi-mi? “Até quando este povo me tratará com pouco caso?

Até quando se recusará a crer em mim, apesar de todos os sinais que realizei entre eles? […] Até quando esta comunidade ímpia se queixará contra mim? Tenho ouvido as queixas desses israelitas murmuradores. Diga-lhes: ‘Juro pelo meu nome, declara o Senhor, que farei a vocês tudo o que pediram: Cairão neste deserto os cadáveres de todos vocês, de vinte anos para cima, que foram contados no recenseamento e que se queixaram contra mim. Nenhum de vocês entrará na terra que, com mão levantada, jurei dar-lhes para sua habitação, exceto Calebe, filho de Jefoné, e Josué, filho de Num.” (Nm 14.11, 27-30)

O v. 23 ainda declara “nenhum deles chegará a ver a terra que prometi com juramento aos seus antepassados. Ninguém que me tratou com desprezo a verá”.

Murmurar é tratar Deus com desprezo, pois desprezamos aquilo que Ele nos deu (e que, portanto, é o melhor para nós, pois temos em Romanos 8.28-29 a promessa de que todas coisas cooperam para nos transformar à imagem de Cristo), ao desejar aquilo que nós não temos, ou aquilo que já tivemos e pedimos tanto para que Deus mudasse.

Murmurar é ser incrédulo, pois significa não confiar nas promessas que Deus nos faz, confiando nas promessas temporárias e ilusórias do pecado e desejando mais o pecado do que a glória de Deus.

Murmurar é ser ingrato por tudo que Deus fez por você! Ele te tirou das trevas (Cl 1.13), te libertou do pecado (Rm 3.24), te deu uma nova vida (2 Co 5.17), te deu o Espírito Santo para te orientar (Jo 14.26), promete prover o escape para as tuas tentações (1 Co 10.13) e promete completar em você Sua obra até o último dia (Fp 1.6).

O que fazer diante do pecado da murmuração?

Pare de ser uma murmuradora e seja uma adoradora!

Em primeiro lugar, Deus sempre nos orienta a nos arrependermos e confessarmos nossos pecados. Esse é sempre o primeiro passo para tratar qualquer problema! Confessar o pecado significa concordar com Deus que estamos erradas e que Ele está certo. Diante dessa declaração racional, Deus promete nos purificar (1 Jo 1.9).

Depois, você precisa se despojar do hábito da murmuração e se revestir de um novo hábito (Ef 4.22-24). Despojar-se significa desabituar-se de fazer alguma coisa. Você só olhava para o que estava faltando? Para o que ainda não tem? Para o que tinha antes e perdeu? Bom, acostume-se agora a olhar para o que você tem, o que Deus te deu, reconhecendo que você tem tudo o que precisa para cumprir a missão que Deus deu a você, que é glorificar a Deus através de uma vida piedosa (2 Pe 1.3)!

Não se esqueça de que mudar o comportamento sem mudar o pensamento e a motivação é ser legalista e não tem nenhum valor para Deus. Ao contrário, nossa mudança de atitude deve estar centrada em uma mudança de mente, um culto racional que oferecemos a Ele (Rm 12.2). Isso só é possível se você se alimentar da palavra de Deus, então, estude a Bíblia! Faça devocionais que estudem os casos de murmuração, que são muitos nas Escrituras. Aprenda a discernir o seu pecado e nutra um olhar providencial da história, sabendo que as situações difíceis também acontecem para o seu bem, pois são oportunidades para você crescer (Tg 1.2,3).

Creia em Deus e desenvolva gratidão, sabendo que a obediência vem acompanhada de uma promessa!

 “Fazei tudo sem murmurações nem contendas, para que vos torneis irrepreensíveis e sinceros, filhos de Deus inculpáveis no meio de uma geração pervertida e corrupta, na qual resplandeceis como luzeiros no mundo, preservando a palavra da vida, para que, no Dia de Cristo, eu me glorie de que não corri em vão, nem me esforcei inutilmente.” (Fp 2.14-16).