DEUS CRIATIVO E SUA CRIAÇÃO

Você já parou para pensar que o primeiro versículo da Bíblia demonstra que Deus é criador? E as habilidades de alguém criador o tornam criativo, portanto, Deus é criador criativo, o primeiro artista.

“No princípio criou Deus os céus e a terra.” Gênesis 1.1

Ainda neste capítulo em Gênesis, pode-se entender que Ele compartilha com suas criaturas qualidades dEle.

“Então disse Deus: “Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança. Domine ele sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu, sobre os animais grandes de toda a terra e sobre todos os pequenos animais que se movem rente ao chão” Gênesis 1.26

Imagem e semelhança são palavras distintas, mas intercambiáveis na língua original, hebraico, em que o texto foi escrito, que demonstram a mesma realidade: o ser humano é reflexo de Deus. Assim, ele tem peculiaridades de Deus, como vontade, inteligência, emoções, “domínio sobre a terra”, e, diferentemente de outras criações da natureza, pode relacionar-se com Ele. Deus criou o homem todo, sem distinção entre sua parte imaterial (alma, espírito, coração) ou material (física), e ele deve adorá-Lo, devolver a Ele suas capacidades, usar sua criatividade para Ele (Rm 11.36). E Deus permitiu que até mesmo àqueles não O conhecem verdadeiramente desfrutarem de algumas de Suas bênçãos, como a habilidade de poder criar algo, presente conhecido como graça comum.

“A graça comum […] mantém, em certa medida, a ordem moral do universo, possibilitando assim uma vida ordenada; distribui em diferentes graus presentes e talentos entre os homens, promove o desenvolvimento da ciência e da arte; e derrama bênçãos incontáveis sobre os filhos dos homens”.(1)

DEUS ORDENA A ARTE

Na Bíblia se pode notar que Deus apreciou a arte, foi Ele quem revelou a Moisés como deveria ser construído o Tabernáculo, com todo o seu padrão estético (Êx 25.40). Ele instruiu que deviam ser colocados querubins no Santo dos Santos (Êx 25.18), candelabros na saída dele com representações da natureza (Êx 25.31-33), e, mais adiante no livro de Êxodo, descreveu a roupa dos sacerdotes com especificidade de cores e detalhes (Êx 28.33). Acho interessante que um dos tons descritos por Deus foi o azul, uma tinta que não podia ser produzida da variação de uma romã, direcionando um princípio de liberdade para se produzir algo a partir da natureza, com criatividade, para adorar a Deus.

Há quem diga que aquelas artes engrandeciam a Deus pois envolviam aspectos religiosos, mas, na realidade, as criações realizadas pelo ser humano para expressar suas ideias, emoções, percepções, sensações, por meio de recursos distintos (sonoro, visual, físico, linguístico, material)(2) em si são doxologia, uma adoração a Ele. Um exemplo de artes cuja orientação da construção por Deus simplesmente foi pela apreciação estética e ornamento foram as pedras preciosas do templo (2Cr 3.6). Outro exemplo que aparece nas Escrituras que não foi diretamente ordenado por Deus, mas permitido, foi o trono “estiloso” de Salomão (1Rs 10.18-20). Também aparecem poesia (2Sm 1.19-27; Cantares de Salomão), música (Êx 15.20-21; 2Cr 29.27-28), teatro (Ez 4.1-3), dança (Sl 149.3, Êx 15.20).

Complementando esta ideia de que a arte não precisa de uma justificativa gospel para ser digna de glorificar a Deus, é interessante considerar o que diz Hookmaaker:

“Precisamos é nos atentar para o fato de que a arte não pode ser usada para mostrar a validade do cristianismo – deve ser o contrário. O cristianismo é verdadeiro; as coisas, ações e esforços humanos só alcançam seu significado a partir de seu relacionamento com Deus. Se Cristo veio para nos tornar humanos, a humanidade e a realidade da arte encontram seu fundamento nele. Então, a arte não deve ser usada para pregação, mesmo que isso seja útil. Existe outra forma pela qual a arte pode ser ou é significativa. Com o intuito de se encaixar aos padrões de evangelismo, os artistas frequentemente têm comprometido e, como consequência, prostituído sua arte”.

A cosmovisão cristã deve moldar toda a construção da arte, de maneira que o artista não precisa adicionar algo santo para validá-la como cristã. Embora Hookmaker use uma palavra pesada, “prostituído”, o que ele quis transmitir é que, ao justificar sua arte valendo-se disto para evangelizar, um artista a desonra.  Exemplos de artes cristãs são os livros de C. S. Lewis e Tolkien. Suas histórias não citaram o nome de Jesus Cristo, mas eram permeadas por princípios cristãos e, certamente engrandecem a Deus. Outros exemplos de que o cristianismo pode permear a arte sem justificativas são o musical “O Messias” de Handel, as pinturas de Rembrandt e as músicas de Bach.

ARTISTAS CRISTÃOS

Contudo, vivemos em um mundo pecaminoso, em que as motivações e os estilos estão corrompidos, não agradam a Deus, embora a criatividade para fazê-los seja um presente dEle para todos. Por isso, o artista cristão deve ser cauteloso.

  1. Deve se valer de estilos modernos, com cautela e norteados por princípios bíblicos. Toda obra artística transmite uma mensagem, e, portanto, o artista cristão não pode ser “ingênuo” ao pensar que está tudo bem ao aderir a qualquer estilo artístico, pois a cosmovisão cristã não comunga com a mensagem de alguns deles e pode ser distorcida. Quando surgirem dúvidas ao criar algo, se está ou não agradando a Deus, deve lembrar-se de que a Palavra de Deus é lâmpada para os pés (Sl 119.105), ler a Bíblia e buscar santidade em tudo. Também deve pedir conselhos para sua liderança e orar antes de tomar decisões artísticas. Mas não deve deixar de produzir à maneira que sua criatividade lhe inspira e de forma que agrade a Ele, pois precisa exercitar a criatividade que o Pai lhe deu.
  2. Tudo que um artista cristão produzir deve ser da melhor qualidade. A excelência é um padrão bíblico para os artistas cristãos, pois, primeiramente, sua arte é uma atitude de adoração ao Pai (Cl 3.17). E, por mais que haja muita empolgação em criar algo, deve cuidar com as motivações em seu coração: embora a arte não precise de justificativas, o artista cristão deve cuidar para não idolatrar fama, dinheiro, prazeres e confortos carnais. Não é pecado almejar crescer em seu trabalho, mas antes, deve-se buscar o Reino de Deus (Mt 6.33). E, para terminar…
  3. A vida do artista cristão deve ser a obra de arte.

Nenhuma obra de arte é mais importante que a vida do cristão e todo cristão deve se preocupar em ser um artista nesse sentido. Ele pode não ter o dom da escrita, nem da composição ou do canto, mas toda pessoa tem o dom da criatividade no que diz respeito à forma como vive a sua vida. Nesse sentido, a vida do cristão deve ser uma obra de arte. A vida do cristão deve ser algo verdadeiro e belo em meio a um mundo perdido e desesperado”.(4)

_________________________________________

  1. Berkhof, L. Teologia Sistemática.
  2. conceito.de/arte
  3. Rookmaaker, H. R. A arte não precisa de justificativa.
  4. Schaeffer, Francis. A arte e a Bíblia.