Quando era criança, minhas amigas filhas de missionários tinham no programa de literatura da escola americana a leitura obrigatória dos livros da Jane Austen. Logo, fui apresentada cedo a essa escritora inglesa tão famosa e assisti todos os filmes pós modernos de histórias que ela escreveu. Com doze anos eu li a versão pocket de Orgulho e Preconceito que comprei na Fnac. Era fácil dizer que ela era incrível, mas na verdade, era nova demais para criticar a literatura dela ou entender o contexto histórico que viveu. Digamos que eu seguia a leva de admiradores dela sem de fato entender quem era ela. Depois dos vinte anos, enquanto reassistia “Orgulho e Preconceito” pela milionésima vez, eu me peguei pensando que a história é trivial, sem grandes surpresas, é um filme “água com açúcar” como diria minha mãe. Cheguei à conclusão de que eu tive um deslumbre fanático na adolescência por algo clichê. Tudo bem, acontece, Jane Austen é clichê mesmo.

    Mas, recentemente, terminei um livro muito legal, recomendo a leitura por sinal, chamado “Oito mulheres de fé” e, para a minha surpresa, a história da Jane Austen estava no último capítulo do livro (cuidado com esse artigo, terá spoilers). Eu li mais de uma vez.

    A história de Jane Austen é incrível, aos 12 anos ela escreveu seus primeiros romances. No século XVIII, era Georgiana, as mulheres eram cobradas por habilidades domésticas, posturas e boa etiqueta, por isso, essa inclinação dela para escrever era tão singular. Poucas delas eram incentivadas a leitura e a escrita, mas o pai de Jane a incentivava, bem como incentiva a sua irmã Cassandra (aliás, que pai).  Em um de seus romances, Jane até advogou a educação liberal para mulheres, que estava acima das limitações domésticas. Demonstrou isso por meio de sua personagem “Elizabeth Bennet”, quando ironizou a fala de outro personagem que afirmava que as mulheres deviam ter ampla educação em música, pintura, línguas etc. Contudo, apesar de valorizar a educação feminina, também valorizava o amor ao cônjuge, o laço matrimonial e vínculos familiares, diferente dos ideais feministas.

    Aos 21 anos, escreveu o tão famoso “Orgulho e Preconceito”, mas teve sua publicação rejeitada pelo primeiro editor. Sua luta com as edições de seus manuscritos aconteceu por toda a sua vida. Em dado momento, um editor se apossou por seis anos do manuscrito do livro “Susan” e ela ainda precisou pagar para consegui-lo de volta. Apesar das dificuldades, ela nunca parou de escrever, acredito que entendeu sua vocação. Vocação é tudo o que somos, recebemos e fazemos que faz Deus sorrir, extrai o nosso melhor potencial em prol da comunidade e nos dá senso de realização [Cl 1.10]. Jane entendeu isso muito bem, porque ela não deixou de escrever, mesmo com tantos obstáculos, como a morte de seu pai, seu grande incentivador, uma mudança repentina de cidade, o fato de ser mulher e ainda ser solteira. Jane nunca se casou e ainda sim acreditava no amor, pregando sobre ele indiretamente em seus romances. Em vez de amargurada pela solidão, ela era inspirada em escrever romances. 

Seu primeiro manuscrito foi publicado apenas quando tinha 36 anos e ainda sem seu nome na obra, um livro anônimo. Fora que seus lucros eram baixos, embora as obras tenham sido um sucesso, pois não detinha os direitos autorais. Infelizmente, aos 41 anos, teve uma doença que, alguns estudiosos sugerem ser um mal nas glândulas adrenais e outros sugerem que era um câncer de mama, mas, a despeito de qual era de fato sua malignidade, ela faleceu sem ter uma única obra publicada com seu nome. Apenas depois de sua morte sofrida, um editor decidiu publicar dois de seus livros com uma nota biográfica sobre a autora, seu primeiro reconhecimento público.

    Meu intuito não é enaltecer uma mulher como um ídolo a ser contemplado, mas a história dela não era clichê como eu julguei. Jane soube usar sua habilidade em escrever, sua paixão por histórias, sua ironia e inteligência acima de seu tempo muito bem. Mesmo com tantas dificuldades, ela fez o seu melhor e pagou o preço por isso, o que deve nos servir de exemplo em uma geração de jovens facilmente derrotados por um psicológico doentio e fraquezas emocionais [me incluo nessa geração também, infelizmente].  

Tristemente, ela não pode desfrutar do devido reconhecimento em vida, mas por ter feito seu trabalho com excelência e lutado por ele, serviu de inspiração e impactou vidas além de seu tempo. Fizeram até museus, mais livros e filmes em sua homenagem. Mas acima dessa genialidade, Jane cria em Deus e algumas de suas orações que foram registradas, demonstravam a sensibilidade que tinha em relação aos seus pecados em contrapartida com a magnitude de Deus. A sua fé pode ser sutilmente percebida em suas obras e suas virtudes, como ser perseverante, gentil e inteligente, também eram reflexo de sua fé. Jane Austen não era uma mulher clichê, comum, mas a sua excentricidade provinha de uma fé leal e um serviço excelente a Deus. De fato, Jane Austen é uma mulher de fé e uma inspiração.