A ficha começou a cair quando eu estava sentada em frente ao quarto no internato onde cursei teologia. Tinha acabado de organizar todas as minhas malas da viagem – de Boa Vista (Roraima), onde morava antes, para Atibaia, interior de São Paulo – e me via longe daqueles que tudo fizeram por mim: meus pais. Lembro-me de começar a imaginar situações que julgava difíceis e pensar sobre como seria me virar sozinha. A primeira pergunta que me fiz foi: E se eu ficar doente, quem vai agendar uma consulta e me levar ao médico?

Vivi um momento parecido anos depois. Tinha me formado no internato e já estava trabalhando quando enfrentei o meu primeiro grande desafio – resolver um mal entendido que me envolvia. Em meu quarto, longe de minha família, eu me questionava: Por que saí de casa? Lá eu tinha a proteção dos meus pais e nunca estaria passando por isso!

Hoje ainda me faço perguntas como essas, mas não só eu; minha geração também. E, como conselheira, percebo que elas refletem um grande problema: a falta de senso de responsabilidade que nos caracteriza como geração.

Queremos viver vida de adulto com responsabilidades de criança. Queremos viver grandes coisas fazendo absolutamente nada. Sabemos que erramos, mas quando isso acontece, jogamos a culpa em alguém ou em alguma situação. Compartilhamos nas redes sociais que os momentos difíceis acontecem para o nosso crescimento, mas quando algo que não queremos acontece, somos mestres em nos vitimizar. Queremos um diploma, mas trocamos leituras e trabalhos por horas na internet ou festas com amigos. Quando um professor ou chefe nos cobra por algo que ainda não cumprimos, vomitamos mil justificativas. Enfim… A falta de senso de responsabilidade que nos marca hoje é reflexo de uma sociedade que não é ensinada a assumir a responsabilidade, de uma criação falha e de uma geração que acredita no mito da “busca pela felicidade”. Resumindo, somos meninas mimadas!

A educação oriental ensina as crianças, desde pequenas, a assumir a responsabilidade por suas ações. No entanto, em nosso contexto ocidental, elas são ensinadas a fugir daquilo que lhes causa desconforto. Em outras palavras, nós, brasileiras, não somos corajosas o suficiente para assumirmos a responsabilidade por nossos atos, sejam eles bons ou ruins. [1]

Isso não vem só das escolas, mas também da criação dada pelos pais, intencionalmente ou não. Por um lado, isso ocorre de forma intencional, pois, atualmente, os pais estão mais interessados em que os filhos estudem em bons colégios, falem fluentemente outras línguas, viajem o mundo e tenham acesso à cultura e à tecnologia, do que dispostos a mostrar a seus filhos que a vida não é fácil, que eles irão sofrer, que eles são falhos e, que, independentemente de sonhos realizados ou não, eles precisam assumir suas responsabilidades. Por outro lado, esse processo também ocorre de forma não intencional, uma vez que o conforto que os pais dão a seus filhos – o que, em si, não é um erro – frequentemente é interpretado de forma equivocada pelos filhos (como algo que eles merecem), o que os leva a crer que todos à sua volta – como o chefe, o colega, o cônjuge, os amigos – devem tratá-los como seus pais os tratariam. [2]

As escolas e pais têm formado jovens que creem no mito da busca pela felicidade. Tal busca impulsiona a fuga da responsabilidade, uma vez que essa traz consigo o “ônus”, as atividades que não gostamos de fazer, ou seja, o contrário do que entendemos por felicidade. Diante disso, muitos jovens se omitem, jogando a culpa nos outros, vitimizando-se, procrastinando, apresentando mil justificativas (ou fazendo tudo isso ao mesmo tempo). A jornalista Eliane Brum escreveu sobre essa questão em um de seus artigos:

“…se os pais mentiram que a felicidade é um direito e seu filho merece tudo simplesmente por existir, paciência. De nada vai adiantar choramingar ou emburrar ao descobrir que vai ter de conquistar seu espaço no mundo sem nenhuma garantia. O melhor a fazer é ter a coragem de escolher. Seja a escolha de lutar pelo seu desejo – ou para descobri-lo –, seja a de abrir mão dele. E não culpar ninguém porque eventualmente não deu certo, porque com certeza vai dar errado muitas vezes. Ou transferir para o outro a responsabilidade pela sua desistência”. [3]

Diante de tudo isso, vemos uma sociedade que tem se viciado em não assumir suas responsabilidades. E, como vimos também, a falta de senso de responsabilidade gera muitos problemas humanamente visíveis. Mas será que é só isso? Não! Existe um problema maior – o espiritual. Além de prejudicarmos a nós mesmos, esse estilo de vida omisso não agrada a Deus; em outras palavras, é pecado, pois reflete o egoísmo do coração humano. Como Paul Tripp diz:

“O pecado nos entrega a nós mesmos. O pecado diminui as nossas vidas aos estreitos limites do pequeno mundo que definimos para nós mesmos. O pecado limita o nosso foco, motivação e preocupação ao tamanho das nossas próprias vontades, desejos e sentimentos. O pecado faz que nos sintamos autoconfiantes e importantes demais. Por causa do pecado, nos sentimos mais ofendidos com as ofensas cometidas contra nós mesmos e nos preocupamos mais com o que diz respeito a nós mesmos. O pecado nutre nossos sonhos egoístas e incentiva planos baseados em nossos desejos. Por causa do pecado, amamos a nós mesmos e temos planos maravilhosos para as nossas próprias vidas”. [4]

É por causa do pecado que eu e você cultivamos uma vida irresponsável, pois preferimos viver no conforto das nossas ambições egoístas e irreais do que encarar o que precisa ser encarado. Realmente, somos meninas mimadas! Precisamos mudar! Mas como? Quando? Por onde começar? Bom, é exatamente isso que responderemos nesta série. Por isso, não deixe de acompanhar! Assuma a responsabilidade que você tem, como cristã, de aprender e praticar o que está escrito na Bíblia, e caminhe nesse estudo conosco.

[1] http://www.jeronimomendes.com.br/o-que-e-responsabilidade/
[2]http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI247981-15230,00-MEU+FILHO+VOCE+NAO+MERECE+NADA.html
[3] Idem
[4] Paul Tripp em “O que você esperava? Expectativas Fictícias e a Realidade do Casamento”, pg. 38.