Quando chegamos ao Ensino Médio, creio que mesmo aqueles mais despreocupados começam a preocupar-se com o futuro. “O que eu quero fazer?”, “O que eu vou ser da minha vida?”; ou, para os mais realistas “O que eu sou capaz de fazer?”. Conheço muitas pessoas que escolheram o curso da faculdade simplesmente olhando a nota de corte do vestibular, ou a disponibilidade de vagas na sua cidade, ou mesmo a proporção de candidatos por vaga. Outros, mais ambiciosos, olham sempre para aquelas profissões que remuneram melhor, e que normalmente são aquelas com mais prestígio. Mas, como devemos escolher o nosso papel na sociedade e no Reino? Ou melhor, será que devemos escolher? (rs) Quais princípios utilizar para tomar essa decisão? Deixe-me compartilhar um pouco da história que Deus tem escrito para mim e o que Deus me ensinou nessa fase tão decisiva.

O QUE EU QUERO FAZER? 

Passadas aquelas crises de identidade e valor, e tendo descoberto minha identidade em Cristo no início da adolescência, cheguei ao Ensino Médio bem certa de que era Filha de Deus e queria permanecer dentro da Sua vontade para sempre. Mas agora, chegando perto de escolher minha profissão, eu ficava me perguntando e perguntando para Deus o que eu deveria ser? Qual seria minha vocação? Muitas pessoas ao meu redor davam conselhos: “Pense no que você gosta de fazer, e você não terá que trabalhar nem um dia da sua vida”, “Converse com profissionais de várias áreas e veja o que você mais gosta”, “Faça um direcionamento vocacional, um acompanhamento psicológico, ou algo assim”, “Pense em um curso que garanta independência financeira”. Mas ainda parecia assombroso para mim a ideia de que um leque enorme estava se abrindo, e a decisão que eu tomasse ditaria meu futuro para sempre. Parecia ser muito difícil tomar essa decisão com 15 ou 16 anos.

A PRESSÃO DO VESTIBULAR

Passado algum tempo no Ensino Médio, aconteceu comigo o que acontece com muitos nessa fase: normalmente passamos mais tempo pensando na prova do vestibular  do que na própria faculdade, ou mesmo na profissão. A pressão dos professores, dos pais, a competição nos rankings de simulados semanais, tudo isso pode levar nosso coração a ficar tão ansioso para aprender e memorizar o máximo de fórmulas, datas e nomes importantes, treinar a física ou a matemática, que de repente parece que sua vida e futuro dependem de passar ou não no vestibular. No que você vai passar ou qual curso vai escolher não parece ser mais tão importante. Você só TEM que entrar em uma universidade. Agora, a gente separa as pessoas entre “aprovados” ou “reprovados”, ou entre “aqueles universitários incríveis” e “aqueles que estão perdendo anos dourados fazendo cursinho”. Seus pesadelos passam a ser ver todos os seus amigos passando na universidade e você voltando para fazer mais um preparatório. Seus sonhos passam a ser o dia em que seu nome vai aparecer na lista de aprovados do vestibular. Sua vida passa a ser ler livros, fazer simulados, treinar temas de redações e passar tardes no plantão de dúvidas fazendo listas de exercícios infindáveis. 

E Deus, em todo o processo? Ah, minha amiga, foi fácil demais esquecer dEle no processo! Eu até me lembrava de pedir oração nos grupos “para passar no vestibular”, ou mesmo me lembrava dEle na hora de fazer as provas, quando a ansiedade batia de verdade (é impressionante como podemos ir ao banheiro tantas vezes seguidas em 4 horas de prova! Rs). Mas, diferente do que eu pensava no começo, ao invés de ter minha identidade em Cristo como centro, eu troquei minhas prioridades. De repente, eu estava recusando um discipulado para poder estudar um pouco mais. Estava deixando de ir à igreja porque estava “cansada demais dos simulados”. Deixei as devocionais, deixei a intimidade com a Palavra de Deus e até mesmo diminui minhas horas de serviço na igreja e na missão em que eu servia, afinal, eu “estava em ano de vestibular”.

Quais as consequências disso? Bom, além do sofrimento imenso com a ansiedade que consome e corrói nosso coração quando esquecemos da soberania e bondade de Deus e passamos a confiar em nós mesmas, outros pecados vêm no pacote. Temor de homens. Inveja. Medo. Incredulidade. Mais ansiedade. E assim o fim do terceiro ano foi chegando e eu percebi que ainda não escolhera uma profissão. Decidi então fazer um direcionamento vocacional com especialistas e a principal área de interesse parecia ser Psicologia. Embora eu nunca tivesse feito terapia, achava interessante a ideia de aprender a ajudar pessoas a resolverem seus problemas (para mim era isso que parecia ser). E pensei que Deus se agradaria disso, pois afinal nós, cristãos, devemos sempre ajudar o próximo. Fiz minha inscrição no vestibular e voltei a estudar como louca. Agora eu só precisava passar.

NA FACULDADE

Queria parar aqui para fazer um parêntese. Muitas pessoas se questionam, “Por quê tantos jovens se desviam da fé ao chegar à universidade?”. Bom, creio que talvez um dos primeiros passos para isso aconteça está bem aqui, nessa etapa do vestibular. Tanto os vestibulandos quanto seus pais e líderes normalmente acreditam que passar na faculdade deve ser a prioridade daquele ano. Mas isso está completamente equivocado. Sabe, com essa imensa pressão que se cria em torno dessa aprovação, muitos como eu acabam se afastando de Deus e do Seu povo com a nobre intenção de se dedicar mais aos estudos. Quando a aprovação vem, você está totalmente vazio, já se esqueceu da graça e está confiando só em si mesmo novamente. Você entra na universidade querendo aproveitar ao máximo, e aí você pode ser conquistado por um desses dois aspectos tentadores da universidade: as festas e vida boêmia, ou a carreira acadêmica e o conhecimento científico. Para alguns, ir em festas sem limites, experimentar prazeres ao extremo e viver a famosa “vida universitária” vira quase que um propósito de vida, e anestesia qualquer tipo de fé. Para outros, o racionalismo e cientificismo ao extremo, a carreira acadêmica e títulos de pesquisa consome sua agenda e intelecto e quando percebemos já é tarde demais, se tornam céticos incrédulos. Por isso, durante o ano do vestibular, não troque suas prioridades! Lembre-se o que Jesus disse: “Busquem, pois, em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas lhes serão acrescentadas” (Mateus 6:33). Esse “Todas as coisas” certamente inclui a aprovação do vestibular na hora certa!

Voltando à minha história, bom, a aprovação veio, mas diferente do que eu esperava, passar na faculdade não me fez sentir tão aliviada ou realizada. Claro que fiquei feliz com a aprovação, mas, ao mesmo tempo, foi amargo perceber que eu perdera meu ano no quarto estudando, e que quase não tinha crescido no meu relacionamento com Deus. Percebi que havia me afastado de muitos amigos e perdido muitas oportunidades de servir e honrar ao meu Senhor. Decidi usar esse tempo de faculdade diferente, iria me dedicar sim aos estudos, mas queria aproveitar ao máximo as oportunidades de ser útil para o Reino de Deus. Afinal, como diz o evangelho, “que adianta ao homem ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma?” (Mc 8:36).

O PONTO DE VIRADA: UMA VIAGEM MISSIONÁRIA

Foi nesse contexto de primeiro ano de faculdade que fui para um acampamento de jovens da minha igreja e lá ouvi uma pregação de um missionário que trabalhava com sua família no interior do nordeste. Ele mostrou a realidade do povo, o contexto social, econômico, mas principalmente falou da idolatria e distância de Deus que o povo sertanejo se encontrava. Ele desafiou nosso grupo a fazer uma viagem missionária para lá e evangelizar, impactar a vida de pessoas como o evangelho. Enquanto ele falava, meu coração ardia. Pela primeira vez eu percebi que aquilo era para mim, que eu tinha que fazer aquela viagem. Eu queria muito ir, mas era como se o Espírito de Deus também estivesse colocando esse desejo em mim. Decidi falar com o casal ao final da pregação e me dispus a ir nas próximas férias, que seriam no meio do ano.

Essa viagem mudou minha vida para sempre. É difícil resumir em um parágrafo tudo o que Deus fez no meu coração naquele mês de julho de 2011, no interior do Ceará, mas vou tentar. Primeiro, percebi que o mundo era muito maior do que minha vida confortável de classe média em SP. Parecia surreal comparar minhas crises do ano anterior, com vestibular, rankings e comparações entre colegas com o que Deus estava me levando a fazer ali. Pessoas estavam vivendo na pobreza extrema, pobreza não só física, como principalmente espiritual, sem Cristo e sem esperança nenhuma. Eu me sentia completamente incapaz de comunicar o evangelho, mas a cada casa que entrávamos o Espírito me dava palavras, e eu lembrava de versículos que eu nem sabia que sabia, me conectava com pessoas, ensinava sobre o amor de Deus e meu coração ardia e transbordava de alegria. Vidas eram entregues a Cristo, destinos eternos estavam sendo mudados ali. Percebi que eu tinha me enganado, pois, na verdade, eu não era digna de decidir meu futuro. Eu só sabia tomar decisões erradas, mas Deus estava agora me levando a perceber algo muito mais profundo para o qual Ele queria me usar. Percebi que eu não podia simplesmente desperdiçar minha vida ganhando e gastando dinheiro todo mês, e vivendo pra mim mesma, como eu pensava que seria a vida adulta. Precisava usar minha profissão para Cristo, para pregar o evangelho, para a expansão do Reino de Deus. E o mais importante, creio que foi, em uma conversa com um dos missionários, entender de fato o que significa que “Vocês, porém, são geração eleita, sacerdócio real, nação santa, povo exclusivo de Deus, para anunciar as grandezas daquele que os chamou das trevas para a sua maravilhosa luz.” (1 Pedro 2:9) e “Vão pelo mundo todo e preguem o evangelho a todas as pessoas.” (Marcos 16:15). O “chamado missionário” não era algo facultativo, algo que Deus dava somente “para os missionários”, não. O chamado para ser missionário é um dever de todo crente, uma missão que o próprio Deus nos chamou para cumprir, uma vez salvos. Portanto, voltei entendendo que, fosse psicóloga ou outra coisa, eu seria uma missionária onde quer que estivesse.

INDO E FAZENDO DISCÍPULOS

Voltando dessa viagem, minha cabeça estava a mil. Comecei a pesquisar sobre como poderia me envolver mais. Pesquisei sobre grupos de evangelismo universitário, pesquisei sobre agências missionárias, comecei até a fazer um curso modular de Teologia para treinamento de líderes no Seminário Bíblico Palavra da Vida. A partir daí, fiz muitas viagens missionárias, visitei quase todos os missionários que minha igreja apoiava: ribeirinhos no Amazonas, indígenas no Mato Grosso, comunidades de pescadores no litoral do Paraná, fiz evangelismo urbano, participei de missões com crianças, e até em um acampamento na Argentina fui servir.

Ao longo do caminho, tive muitas crises com a Psicologia, pois percebi que as teorias da Psicologia mais atrapalhavam as pessoas do que ajudavam. Muito humanismo, muitas soluções centradas na capacidade humana e muitas técnicas que escondem e maquiam o pecado ao invés de confiar em Cristo e resolver como a Bíblia fala. Não quero que minhas palavras desencorajem você, jovem que cursa Psicologia e crê ser possível conciliar nossa fé com as teorias de Skinner, Freud, Jung ou mesmo Piaget. Mas sugiro que procure com sinceridade, como eu fiz na época, a visão daqueles que dizem não ser possível fazê-lo. No meu caso, tive algumas leituras que me ajudaram muito, conversas com pastores e Conselheiros Bíblicos e, principalmente, o Curso de Aconselhamento Bíblico da ABCB

Por fim, percebi que seria melhor trocar de curso do que passar mais 4 anos e me formar em algo que eu não acreditava de fato ser útil para o Reino. Deus me deu coragem para fazer o que eu jamais achei que teria coragem de fazer um dia na vida: voltei ao cursinho, e enfrentei o vestibular novamente! Dessa vez, com o coração no lugar certo e as prioridades certas, vivi essa experiência de uma maneira totalmente diferente. Foi um dos anos que mais cresci e aprendi em toda minha vida. Aproveitei o tempo de preparação para me preparar para entrar novamente no meio universitário, agora como uma missionária.

Minha segunda faculdade foi um tempo maravilhoso. Junto com outros jovens da minha igreja que cursavam a mesma universidade (Unicamp), iniciamos um grupo de evangelismo que, quando terminei o curso, já tinha se multiplicado em cinco outros grupos. Evangelizamos no campus, discipulamos, introduzimos jovens no contexto do corpo de Cristo e na perspectiva da cosmovisão cristã. Nos grupos, estudávamos como poderíamos usar nossas profissões para o Reino e ter uma perspectiva cristocêntrica sobre todas as coisas. Também lidávamos com questões existenciais e aconselhamento bíblico. Foi um tempo de muitas amizades boas, conversas que eu nunca vou esquecer e memórias maravilhosas. Aprendi a pensar biblicamente muito mais do que eu imaginava, minha fé era confrontada, mas agora eu tinha muitas armas para crescer em Deus ainda mais, porque agora eu sabia não só minha identidade como Filha de Deus, mas também minha vocação: Missionária do Reino de Deus!

Espero que Deus tenha encorajado você através desse testemunho e espero você na semana que vem, quando falaremos sobre a terceira descoberta que mudou minha vida: minha aliança, ou melhor, como eu descobri com quem deveria me casar. Até lá!

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 ¹“Nossa Suficiência em Cristo”, de John McArthur; “Deus em Questão”, de Armand Nicholi; “Coletânea de Aconselhamento Bíblico do SBPV” e “Aconselhamento Bíblico Cristocêntrico”, vários organizadores.

² Associação Brasileira de Conselheiros Bíblicos, oferece treinamentos presenciais e online e conferências anualmente. Mais informações em https://abcb.org.br/