Há alguns meses eu estava numa roda de conversa com uns jovens de minha igreja, em um dos encontros que fazemos com certa regularidade. Não lembro ao certo como chegamos nisso, mas em determinado momento alguém se manifestou dizendo que não deveriam existir elogios pois eles fazem mal. O que ficou evidente nestas palavras, embora a pessoa provavelmente não tenha percebido, é que intimamente ela trava lutas com seu orgulho. Sua colocação expressou algo que lhe estava muito latente, mas a bem da verdade, ela só deu sonoridade a pensamentos que passam na cabeça de todas nós.

    O problema detectado não é o elogio em si, mas a maneira que o coração lida com ele. Nós vivemos num mundo de mais de 7 bilhões de pessoas e é natural do ser humano não querer ser apenas mais um na multidão. Queremos nos diferenciar, queremos notoriedade e sucesso, mostrar que somos boas em alguma coisa, que somos as melhores no que fazemos, que nossas capacidades nos colocam acima da média, que há algo de especial em nós.

    Quando perguntam quem você é ou pedem para que você fale algo sobre você, qual é a rapidez com que sua resposta se transforma numa lista das coisas que você faz? Somos medidas por talento, beleza e produtividade, e quando nos diferenciamos em alguns desses aspectos, nosso coração se enchettt de orgulho… Um orgulho que requer reconhecimento dos outros, que demanda competição e que se satisfaz em ser melhor que alguém.  

    Alguns dias depois dessa conversa, e dos desdobramentos dela borbulharem em minha mente, encontrei-me num novo diálogo que alimentou essas ponderações. Dessa vez, dois amigos meus mencionaram a frase que ouviram de um pastor que admiram muito, frase esta que se tornou o nome e o norte deste artigo: “não existe glória quando se carrega uma cruz”. Estávamos conversando sobre a predisposição que temos de nos orgulhar pelo que somos e fazemos, quando essa frase foi citada sob o enredo de que é ilógico que nos orgulhemos se somos, de fato, discípulas de Cristo. Quando fomos alcançadas pela Graça, uma cruz nos foi entregue para que a carregássemos por este mundo. A cruz representa morte, vergonha, autonegação, rendição e, definitivamente, não há espaço para glórias pessoais quando nos deparamos com esse chamado do Evangelho – que tem sido esquecido em nossos dias. As palavras do próprio Jesus foram:

“Se alguém quiser acompanhar-me, negue-se a si mesmo, tome diariamente a sua cruz e siga-me. Pois quem quiser salvar a sua vida a perderá; mas quem perder a vida por minha causa, este a salvará. Pois que adianta ao homem ganhar o mundo inteiro, e perder-se ou destruir a si mesmo?” (Lc 9.23-25)

    Nós somos pecadoras e, naturalmente, o nosso corpo encontra prazer na corrupção – é isso que Paulo expressa em Romanos 7 ao descrever a luta entre carne e espírito. Uno-me à ele em suas palavras quando ele afirma “miserável homem que sou” (Rm 7.25) porque olho para minha incapacidade de me submeter à vontade de Deus. E é por isso que o convite do Evangelho é para carregar uma cruz. Pela capacitação de Cristo, preciso crucificar meus desejos naturais que são contra a santidade do Deus a quem confesso ser meu Senhor. Há uma jornada de renúncia e transformação a ser trilhada nesta vida, e quando essas verdades estão em foco, não há espaço para manifestações do meu ego. Ao passo que, quando perco essas verdades de vista percebo, sorrateiramente, meu orgulho me dizendo o “quanto eu sou boa, que estou sempre certa, que mereço glórias, que sou melhor do que alguém”. Miserável pecadora que sou, desesperadamente carente da misericórdia de Deus que, por Sua graça, torna-se nova a cada manhã (Lm 3.22-23). Conhecendo a corrupção do meu coração, entendo que preciso levar minha cruz por amor Àquele que, conhecendo a corrupção do meu coração melhor do que eu mesma, entregou-se à missão de tomar a cruz por mim e assumir a pena da minha condenação.

    Jesus, ao mencionar que aqueles que quiserem salvar a sua vida a perderão, está se referindo às pessoas que se apegam à essa vida: às glórias, aos prazeres e aos holofotes que destronam Deus do coração humano. E ao final, sua pergunta retórica nos constrange a considerar que não há recompensas nessa vida que valham o preço de estar eternamente longe do Senhor. Quando tomamos a cruz que nos é proposta, nosso ego é levado ao chão e Cristo é glorificado.

    Que nos lembremos com temor de que Deus Se opõe aos orgulhosos (Tg 4.6), Ele monta guarda contra aqueles de olhos altivos. Não há lógica no orgulho pois nada do que temos ou somos vem de nós (1Co 4.7), mas dAquele que sustenta o universo em Suas mãos. A glória é dEle, e o mesmo Deus da glória nos concede graça quando humildemente o seguimos.

    Por fim, creio que o comentário sobre elogio, mencionado no início do texto, estava equivocado. A Bíblia condena o elogio direcionado a quem o faz (Pv 27.2); mas quando elogiamos alguém sinceramente, temos a oportunidade de reconhecer porções da multiforme graça de Deus distribuídas sobre a humanidade, traduzida em talentos diferentes, belezas diversificadas e capacidades surpreendentes. São pequenos vislumbres da grandeza de Deus. Quando elogiamos, também temos a oportunidade de honrar alguém e reconhecer que a vida no Reino de Deus não é uma competição de quem faz melhor, mas uma complementaridade de trabalhos feitos com excelência. E quando o elogio for direcionado a você, lembre-se da cruz que você carrega, Provérbios 27.21 diz que o elogio te põe à prova. A glória de quem você é e do que você faz pertence Àquele que tomou uma cruz ainda mais pesada, revestida da ira de Deus pelo seu pecado, e a venceu para que, por meio dEle, você fosse quem você é e fizesse o que você faz.