Na semana passada vimos o conceito de cosmovisão, e como ela está relacionada com nossas atitudes, inclinações, pensamentos e com a forma pela qual enxergamos ou agimos no mundo. Hoje vamos falar um pouco sobre o que caracteriza cada uma das cosmovisões majoritárias, ou seja, as mais comuns e que exercem maior influência nas sociedades ao redor do mundo. Para isso, vamos usar as classificações de James Sire[1], que elenca oito principais cosmovisões. É importante ressaltar que há categorizações mais especificas [2], que elencam mais cosmovisões, mas não é meu objetivo falar sobre todas, apenas sobre as principais, para termos uma ideia das diferenças fundamentais entre elas. Assim, como afirma Sire, “cada cosmovisão considera as seguintes questões básicas: a natureza e o caráter de Deus ou suprema realidade, a natureza do universo, a natureza da humanidade, a questão quanto ao que ocorre a uma pessoa quando ela morre, a base do conhecimento humano, a base da ética e o significado da história.” [3]
AS COSMOVISÕES MAJORITÁRIAS [4]
CRISTIANISMO (TEÍSMO CRISTÃO) |
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Deus |
Universo | Humanidade | Morte |
Deus existe, é infinito e pessoal (trino), transcendente e imanente, onisciente, onipotente, soberano e bom. |
Criado por Deus com o propósito de demonstrar sua glória, mas sofreu a queda junto com a humanidade. Trata-se de um sistema aberto (Deus intervém). |
Criada à imagem de Deus (bons), mas devido à queda (pecado) tornaram-se maus. Podem ser redimidos através de Cristo. |
Para os salvos, representa o portão para a vida com Deus e seu povo (céu), para os não-salvos, o portão para a separação eterna de Deus (inferno). |
Conhecimento |
Ética |
História |
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Podemos conhecer tanto o mundo que nos cerca quanto o próprio Deus, pois Ele mesmo nos dotou de inteligência. | A ética é transcendente e alicerçada no caráter de Deus como bom (Ele define o certo e errado). |
É linear, uma sequência de eventos significativos, que levam ao cumprimento dos propósitos de Deus para a humanidade. |
DEÍSMO |
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Deus |
Universo | Humanidade |
Morte |
Deus existe e não é totalmente pessoal (relacional), não é soberano sobre assuntos humanos e não é providencial. |
Deus criou o universo, mas o deixou funcionar por conta própria. Este não é decaído ou anormal. Trata-se se um sistema fechado (milagres não são possíveis). | Os seres humanos, embora pessoais, fazem parte do mecanismo do universo. |
Não há consenso entre os deístas: alguns acreditam na imortalidade da alma e outros não. |
Conhecimento |
Ética |
História |
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Podemos conhecer o universo através da razão e por meio de seu estudo determinar como Deus é. |
A ética é restrita à revelação geral; pelo fato de o universo ser normal, ele revela o que é certo. |
A história é linear, pois o curso do cosmo foi determinado na criação. |
NATURALISMO |
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Deus |
Universo | Humanidade |
Morte |
Deus não existe. A matéria existe eternamente e é tudo o que há. |
O cosmo existe como uma uniformidade de causa e efeito em um sistema fechado, que ainda não compreendemos muito bem. |
São “máquinas” complexas; seu valor está na personalidade, que é uma inter-relação de propriedades químicas e físicas ainda não totalmente compreendidas. |
A morte é a extinção da personalidade e da individualidade. |
Conhecimento |
Ética |
História |
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O conhecimento é um produto da mente humana e a única forma pela qual alguém pode prolongar sua existência (deixando um legado para futuras gerações). |
A ética está relacionada apenas aos seres humanos e é autônoma e situacional (pode ser útil para a sobrevivência).
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A história é uma corrente linear de eventos ligada por causa e efeito, porém, sem uma proposta abrangente. |
NIILISMO |
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Deus |
Universo | Humanidade | Morte |
Deus não existe. |
Não há sentido no cosmos. O acaso foi o gatilho que levou ao surgimento de tudo e ele não possui causa, propósito ou direção. | São “máquinas” conscientes, mas incapazes de afetar seus próprios destinos ou realizar algo significativo. |
Não é possível entender o que é a morte. |
Conhecimento |
Ética |
História |
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Não é possível conhecer nada. A razão humana não é confiável, mas ilusória. Alguns niilistas chegam a duvidar da própria existência da realidade. | Não há sentido em estabelecer uma ética. |
A história não obedece nenhuma regra, simplesmente acontece e não é possível entendê-la |
EXISTENCIALISMO |
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Deus |
Universo | Humanidade |
Morte |
Se Deus existe ou não é uma questão difícil de ser resolvida, mas pode ser útil para enfrentar o absurdo da realidade objetiva. |
O universo é composto apenas de matéria, porém para o ser humano a realidade se apresenta em duas formas – subjetiva e objetiva. | A existência precede a essência; as pessoas fazem de si mesmas o que são. Cada pessoa é totalmente livre com respeito à sua natureza e ao destino. |
A morte não tem significado em si, mas cada um pode criar um significado que desejar. |
Conhecimento |
Ética |
História |
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O conhecimento é subjetividade; a verdade total é com frequência, paradoxal. |
O mundo objetivo que existe é absurdo. Cada pessoa deve revoltar-se e criar seu próprio sistema de valores e propósito. |
A história como registro de eventos é incerta, sem importância, mas a história como modelo, tipo ou mito a ser feito presente e vivenciado é de suprema importância. |
PANTEÍSMO |
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Deus |
Universo | Humanidade |
Morte |
Deus é o universo e tudo no universo é deus. |
A alma de cada um e de todo ser humano é a alma do cosmo. | Perceber a unidade com o cosmo é ir além da personalidade. |
A morte é o fim da existência pessoal, individual, mas não altera nada de essencial na natureza do indivíduo. |
Conhecimento |
Ética |
História |
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Muitos (se não todos) caminhos levam ao um. |
Perceber a unidade com o cosmo é ir além do bem e do mal; o cosmo é perfeito a todo momento. |
Perceber a unidade com o um é ir além do tempo. O tempo é irreal. A história é cíclica. |
MISTICISMO OCIDENTAL OU NOVA ERA |
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Deus |
Universo | Humanidade |
Morte |
Não existe um só deus, mas muitos. Há um deus no topo da hierarquia dos seres espirituais, mas ele não é criador e nem pessoal. É necessário, no entanto, apaziguar os seres maus e agradar os seres bons para obter favor e proteção. |
O cosmo, embora unificado no eu, é manifesto em duas dimensões: o universo visível, que é acessível por meio da consciência comum, e o universo invisível (ou mente expandida), acessível por estados alterados de consciência. | O eu é o centro, a realidade fundamental. Como os seres humanos crescem em sua consciência e compreensão desse fato, a raça humana está no limiar de uma transformação radical na natureza humana. |
A morte física não é o fim do eu; sob a experiência da consciência cósmica, o temor da morte é removido. |
Conhecimento |
Ética |
História |
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O conhecimento pode ser alcançado por meio da experiência da consciência. |
A essência da experiência da Nova Era é a consciência cósmica, na qual categorias comuns de espaço, tempo e moralidade tendem a desaparecer. |
A história é uma sequência evolutiva. |
PÓS-MODERNISMO |
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Deus |
Universo | Humanidade |
Morte |
Não se sabe se existe deus, mas se admite uma espiritualidade plástica. |
Não é possível saber nada sobre o universo, pois não há conexão conhecida ou conhecível entre o que nós pensamos e dizemos com o que na realidade existe. | Não há eu substancial. Os seres humanos fazem de si mesmos o que são pelas linguagens construídas sobre eles mesmos. |
Cada cultura tem uma narrativa sobre a morte e todas devem ser consideradas igualmente válidas. |
Conhecimento |
Ética |
História |
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A verdade sobre a própria realidade está para sempre oculta de nós. Há um jogo de poder na construção de narrativas. Qualquer uma que se declare única verdadeira será considerada opressiva. |
A ética, como o conhecimento, é uma construção linguística. O bem social é tudo aquilo que a sociedade assume ser. |
Não existe apenas uma história, mas várias. As histórias servem para propiciar às comunidades o seu caráter de coesão e devem ser consideradas igualmente válidas. |
Talvez olhar para esta tabela a assuste um pouco, ou no mínimo a deixe pensativa, com algumas perguntas. O que concluir disso tudo? Seria o cristianismo (ou teísmo cristão) apenas mais uma cosmovisão, dentre as muitas que existem? Como saber que a cosmovisão cristã é a correta, se existem tantas opções? Semana que vem trataremos um pouco sobre essa questão. Também buscaremos entender como a percepção de que existem todas estas (e muitas outras) visões de mundo pode nos ajudar em nossos relacionamentos e até mesmo no evangelismo. Até lá!
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[1] Sire, James W. O Universo ao lado: um catálogo básico sobre cosmovisão. Editora Hagnos, 2009.
[2] Veja outra categorização em http://www.veritasbr.com/single-post/2015/11/18/Qual-a-Sua-Cosmovis%C3%A3o
[3] Ibid. p.27
[4] Tabela criada com base na análise de James Sire em “O Universo ao lado”.
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