Talvez o título desta série tenha intrigado você. Como as palavras “desperdício” e “sofrimento” podem aparecer numa mesma frase? Aparentemente, são conceitos que não se comunicam. Como é que o sofrimento pode ser desperdiçado? Confesso que é uma paráfrase de uma ideia lançada por John Piper em um de seus textos e, quando tive acesso à ela, encaixou perfeitamente com o que eu tinha em mente para esta série. O sofrimento, em Cristo, ganha novas perspectivas que conduzem à esperança, e nunca ao desespero. No entanto, se as suas lutas tem lhe levado a extremos de desesperança e frustração, há grandes chances de que seu sofrimento esteja sendo desperdiçado. Talvez você esteja tão focada em sua própria dor que tenha se tornado incapaz de perceber que por detrás das aflições que podem assolar um coração, há verdades espirituais que conduzem à uma vida plena e firmada na paz de Cristo. Esse é o intuito desta série! Abordar os desdobramentos espirituais do sofrimento na vida do cristão que não permitem que ele desfaleça, mas que seja renovado em esperança.

Toda a angústia que esse mundo vivencia tem uma razão: o pecado. Em Gênesis, capítulos 1 e 2, lemos que o mundo foi criado perfeito. Não existia lágrima, não existia dor, não existiam doenças, não existia morte. Adão e Eva alimentavam-se da árvore da vida e desfrutavam de toda a perfeição da criação. Mas no capítulo 3 a história da humanidade tomou um novo rumo: o orgulho enraizou-se no coração do homem que, tomando parte do livre arbítrio que lhe fora dado, cedeu à tentação.  A natureza humana foi corrompida, bem como toda a criação. As consequências do pecado foram a morte espiritual, a morte física, as doenças, o sofrimento, a perversidade do coração, a desordem da natureza… O pecado entrou em cena destruindo a plena comunhão que havia entre a criatura e o Criador. O que vivemos aqui são os penosos desdobramentos da escolha orgulhosa que a humanidade fez representada em Adão. Jesus nos avisou que este seria um mundo de dores, e que iríamos sofrer (Jo 16.33). Em maiores ou menores proporções, as aflições farão parte das jornadas de todos nós. Mas essa palavra não vem sem esperança, pois para aqueles que foram redimidos, o passar por lutas ganha três propósitos que serão abordados nos próximos artigos: (1) ensinar e moldar o crente à imagem de Cristo;  (2) evidenciar a glória que está por vir, quando todo o sofrimento terá fim; (3) consolar outros e edificar a Igreja.

Antes de dar continuidade à série e focar nos propósitos do sofrimento, gostaria de direcionar sua atenção para o próprio Cristo. Isaías 53 apresenta-o como o maior exemplo de sofrimento: “homem de dores e que sabe o que é padecer” (v.3). Mas se o sofrimento é consequência do pecado, e Jesus jamais pecou, porque Ele sofreu? Hebreus 4.14-15 responde essa pergunta para nós:

“Portanto, visto que temos um grande sumo sacerdote que adentrou os céus, Jesus, o Filho de Deus, apeguemo-nos com toda a firmeza à fé que professamos, pois não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas, mas sim alguém que, como nós, passou por todo tipo de tentação, porém, sem pecado.”

Ele veio encarnar a humanidade por completo, conhecer de perto a fraqueza e o sofrimento humano, para que pudesse interceder por nó diante do Pai. O próprio Deus conheceu a miséria humana e compadeceu-se dela. Assim, Jesus torna-se o maior exemplo para seguir na maneira em que lidou com suas dores, mas também é aquele que tem cuidado de nós pois não nos deixou sozinhas, e tendo conhecido nossas dores, enviou-nos o Consolador. E é essa a palavra de encorajamento que quero deixar com você no início desta série: você NÃO precisa chorar sozinha, pois você não está sozinha em sua dor. Se por um lado as aflições fazem parte da existência humana, Aquele que conhece as fraquezas do seu coração prometeu que estaria com você.

Deus ministrou essa verdade ao meu coração alguns meses atrás, de maneira inesperada, enquanto fazia minhas devocionais num livro de meditações em Salmos, do Charles Swindoll. Foi por meio do Salmo 23 que fui constrangida a refletir sobre isso. É um salmo que eu conheço e sei de cor desde criança, e se não me falha a memória, acho que decorei o Salmo 23 antes mesmo de João 3.16. E talvez por isso, tenha me passado batido por tantos anos. Davi, um pastor de ovelhas, coloca-se no lugar de uma ovelha e passa a olhar para Deus como o seu pastor. Ele descreve paisagens tranquilas pelas quais o pastor conduz suas ovelhas. No entanto, o salmista sabia bem que em alguns momentos era necessário conduzir o rebanho por vales perigosos para que chegassem a pastagens melhores. E quando, no texto bíblico, o cenário se torna obscuro, o pastor ainda está ali conduzindo o rebanho. Era necessário passar pelo vale da sombra da morte. O salmo não descreve ovelhas desgarradas desviando-se de seu percurso, muito pelo contrário, o pastor conduziu-as por ali porque lhes era necessário passar por aquele vale. Mas ele ainda estava ali, presente, protegendo seu rebanho e prontamente oferecendo seu consolo: ele jamais abandonaria suas ovelhas. E isso traz paz aos nossos corações.

Em alguns momentos nossas vidas serão conduzidas pelo próprio Deus a passar por vales de sofrimento. Como diz C. S. Lewis, “Deus sussurra e fala à nossa consciência através do prazer, mas grita-lhe por meio da dor: a dor é o seu megafone para despertar um mundo adormecido”. Esses vales podem ser momentos breves ou dias que pareçam intermináveis! Podem ser em virtude de pecados que precisam ser confessados, de acontecimentos inesperados, de doenças e duras perdas, ou até mesmo de relacionamentos difíceis…  Mas Ele nos conforta dizendo que Ele é o Bom Pastor que está “gritando” (emprestando o termo de Lewis) Suas palavras de conforto, que está presente em meio à nossas lágrimas e que não quer que as derramemos sozinhas. Ele garante que não nos permite passar por provações que não possamos suportar (1 Co 10.13) e que provê tudo o que precisamos para encontrar descanso em Sua presença. Enquanto passamos por dias difíceis, podemos desfrutar do consolo do Senhor. Mas Ele também nos provê com verdades bíblicas às quais devemos nos agarrar para que tenhamos esperança em meio à dor. Continue acompanhando nossa série e conversaremos melhor sobre essas verdades nas próximas semanas. Que Deus te abençoe!